terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Ensaio II

Não se nasce poeta. No entanto, acredito que alguns nascem com algumas propensões para poderem vir a emboscar-se no acto poético. Contudo, a leitura, o estudo, a prática, o intenso exercício de oficina, escrevendo e reescrevendo, são essenciais para talvez se vir a ser um excelente poeta. E é tudo isso que Andityas Soares de Moura é, fez e continua a fazer. Conjuntamente com nomes como Iacyr Anderson de Freitas, Claudia Roquette-Pinto, Ricardo Aleixo, Claudio Daniel, Fabrício Carpinejar ou Márcio André, é, sem dúvida, hoje, um dos mais expressivos poetas da poesia contemporânea brasileira.
Soares de Moura possui a capacidade de conjugar a sua alta erudição (ao grande domínio da língua e cultura latinas, alia um tratamento de grande intimidade com os poetas provençais e escreve com a mesma facilidade e docilidade com que fala mineiro) com a realidade que o cerca como espigões acesos, "um/som//:o do peito sendo aberto/".
Em Soares de Moura encontramos uma poesia quase sempre espalhada no branco da página, assente em formas rebeldes, mas ajustadas numa escrita concisa, onde a preocupação extrema com a estética das palavras é reflectida na sua sonoridade. Sendo um poeta virado para o real, para quem a poesia é a arte do fazer, é a arte e faculdade poética, mas sempre como poiesis – criação, cri(ação) sob todas as arestas -, a sua poesia é "tudo que respira/canta a glória de estar/por enquanto,//e só por enquanto,//vivo/".
Soares de Moura não concebe a arte poética, se esta não questionar constantemente o real, como se a poesia fosse o último guerreiro atento à tirania do poder, à tirania da própria linguagem. A arte e a poesia ao serviço do carpe diem, do ensejo único, o nosso.
Como refere o poeta Glauco Mattoso, a poesia de Andityas Soares de Moura, "oscila entre o moderno e o arcaico, com traços concretistas namoriscando o mais arrevesado latinório", que embebida numa alta tensão lírica, fará decerto de Andityas Soares de Moura um dos nomes maiores da poesia brasileira deste desencorajado início de século.
João Rasteiro(*), Dezembro de 2007
(*) Texto incluido na Badana/Orelha da Antologia de Andityas Soares de Moura: "Algo Indecifravelmente Veloz" - edium editores

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